sexta-feira, 10 de setembro de 2010

2- Primeiros sintomas da Síndrome de Guillain-Barré

Demorou um pouco para minha mente voltar ao normal. O aeroporto parou para mim naquele momento. Todo barulho, confusão, tudo parou. Peguei meu carrinho com as malas e sem pressa fui procurar onde remarcar minha passagem. Foi um processo de exaustão tão grande que sugou todas minhas energias, a cada segundo eu pensava, "não deveria ter vindo, não deveria ter vindo, não deveria ter vindo". Tudo desde o começo deu errado, e não tinha como pensar diferente. Minhas férias mal tinham começaco e já tinham se tornado um pesadelo.
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Consegui comprar outra passagem para o mesmo dia, mas o vôo não sairia do aeroporto de Guarulhos, e sim do de Congonhas. Claro, sem exitar, paguei os 50 reais de taxa e fui avisar meus pais do que tinha acontecido, denovo.
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Nesse meio tempo, entre perder as malas e perder o vôo, eu tinha me esquecido completamente de encontrar o Miguel. Miguel é a pessoa que estaria esperando por mim no aeroporto, às 7 da manhã, para pegar uma encomenda, na verdade um presente de grego que eu dei para a filha dele, minha querida amiga mais nova Nicole, no Natal, e pelo tamanho, uma cadeira, não conseguiram embarcar na volta para o Brasil.
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Conheci a Nicole pessoalmente porque, junto com sua mãe Sandra e seu pai Miguel, vieram passar o Natal junto com a Joice, uma grande amiga que fiz aqui em Dublin. Apesar de ter apenas 10 anos, Nicole se tornou minha oficial BFF, "Best Friend Forever". Por causa de toda sua paixão pela Hanna Montana, como presente de Natal, o Pankaj e eu resolvemos dar uma cadeira da Hanna Montana para ela, e no final, o presente não coube na bagagem e por ser de aço, não passou como bagagem de mão.
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Foi essa família que nos acolheu em Dublin durante o Natal e Ano Novo e fez a maior diferença. Sempre é bom ter a presença de familiares, e nesta época do ano melhor ainda. Todos juntos, com a família da Joice, tivemos um ótimo Natal que com certeza resultou em amizades para a vida inteira.
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Voltando para o aeroporto, a cadeirinha no fim ficou comigo e fiquei de entregar assim que chegasse em São Paulo para o Miguel. Como já estava mais de 3 horas atrasada, em nenhum momento imaginei que ele pudesse ainda estar me esperando, mas como tudo tinha que dar errado, a cadeira estava dentro da mala que foi extraviada.
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Assim que remarquei a passagem, foi atrás de um telefone público para ligar para meus pais. Não sentia nada, só raiva. Liguei para o posto, meus pais têm um posto de gasolina, e meu pai atendeu. Assim que escutei a voz dele, quase não conseguia explicar o que tinha acontecido de tanto que eu chorava. Era mais um choro de raiva. Me lembro muito bem de ter falado alguns palavrões quando lembrava da mala e de todo o atraso, mas chorar foi algo que faltava para limpar todo o peso que o estresse tinha me causado. Como ele, claro, estava com a cabeça bem mais calma, lembrou que minha tia Sílvia mora perto do aeroporto de Congonhas e disse que ligaria para ela para poder me pegar em Guarulhos e me deixar no outro aeroporto. Fiquei de ligar em alguns minutos para ver o que faria.
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Depois que desliguei o telefone, dei alguns passos para frente, ainda analizando para que lado eu iria. Tinha decidido ir para a esquerda, porque já conhecia aquela parte do aeroporto e tinha certeza que encontraria algum banheiro facilmente, para eu poder lavar o rosto e tentar me acalmar. Por conta de algo que não sei explicar, dei meia volta e foi para o lado oposto. Assim que andei alguns metros aviste o Miguel. Minha reação novamente, claro, foi chorar. Acho que ver algum rosto conhecido naquele lugar mexeu comigo de uma forma diferente, não era mais um choro de raiva, era um choro de alívio.
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Nos abraçamos e ele me explicou tudo o que tinha acontecido. Que o portão de desembarque do meu vôo tinha mudado, mas como tudo foi atrasado, ele não sabia se eu já tinha saído, se estava em algum lugar do aeroporto esperando por ele ou se já tinha conseguido pegar minha conexão. Pedi desculpas pelo atraso, já fui explicando sobre minhas malas, que a cadeirinha da Nick não tinha chegado, e ele dispara, "Que bom que deu certo anunciar o seu nome no aeroporto, assim foi mais fácil você me encontrar". Eu juro que em nenhum momento eu consegui escutar o meu nome. Com tanta confusão, ligação para meus pais, eu nunca teria escutado. Naquele momento que eu mudei minha direção, alguma força superior me mandou para quem estava me procurando e nada foi por acaso.
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Miguel me ajudou com as malas, ligou para a Sandra e avisou que tinha me encontrado. Sandra, mais do que eficiente, ligou para meus pais e aviou que o Miguel já tinha me encontrado e estava me levando para a Conceito, empresa onde eles trabalham. Quando liguei para meu pai, para contar tudo, era ele que já sabia de tudo.
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Fomos conversando, ainda tentando entender como por um acaso eu tinha o encontrado. Durante o caminho também foi me explicando tudo sobre São Paulo, os caminhos, me mostrando ruas e como naquele momento poderíamos fazer parte das estatísticas, por estar no trânsito engarrafado de São Paulo. Falamos sobre a Índia, o Miguel teve uma experiência ótima na Índia, quando ficou por lá morando em um Ashram. Falei do quanto eu ainda precisaria evoluir como pessoa, como estava aprendendo com o Pankaj, mas que uma experiência dessa na minha vida também seria ótima.
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Assim que chegamos, logo me levou para a sala da Sandra. Foi bom revê-la depois de tão pouco tempo, em um ambiente totalmente diferente. Acho que faziam apenas 3 dias que eles tinham voltado de Dublin. Uma coisa que comentamos muitas vezes em Dublin é que estar no Brasil e conhecer tudo que apenas ouvimos anteriormente dá uma sensação de que tudo é real e isso é surreal. Por semanas conversamos sobre a Conceito, brincando sobre qual função cada um de Dublin teria na empresa, porque todos voltaríamos com emprego certo por lá. Foi engraçado pelo menos, se é que posso usar essa palavra, ter a Conceito e muitas outras pessoas e ambientes concretizados no Brasil.
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Depois de pegarmos a Nicole BFF na casa de uma amiga, fomos todos almoçar. Por anos pensei em comer aquela comidinha caseira. Eles acertaram no restaurante, o qual poderia chamar de "RESTAURANTE PARA FAZER FELIZ AQUELES QUE MORARAM ANOS NO EXTERIOR". Muita salada e típica comida caseira brasileira, tudo que eu precisava depois de tanto nervosismo.
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Outra coisa que se materializou foi a casa deles. De repente, não estava só na casa da Sandra e do Miguel, mas também na casa do Brasil da Joice. Tomei meu banho, tentei ficar na sala um pouco com a BFF, mas tive que ir para A CAMA DA JOICE, dormir um pouco antes do próximo vôo. Dormi e foi depois disto que tudo começou. Acordei muito rouca, pouco de dor na garganta e com os pés dormente. Claro que depois de tudo, qualquer um pensaria na garganta como alguma reação do meu corpo por causa da mudança de clima e no caso dos pés, má circulação,por conta das horas de vôo. Minutos antes a Sandra até tinha me mostrado como os pés dela estavam inchados depois da viagem. Estava bem apesar de tudo, só um pouco cansada e isso era fácil explicar.
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Já no aeroporto de Congonhas tudo deu certo, desta vez no horário consegui fazer o check-in e ir para minha sala de embarque. Na despedida, mal conseguia falar com a Nicole e Júlia que estavam lá junto com a Sandra, para me dar tchau, já quase sem voz.
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Encontrei meu portão de embarque, sentei e esperei. Esperei, esperei, até eles mandarem formar fila. Uma chuva torrencial começou. O único aviso que tinha no monitor do portão era que o vôo estava atrasado, sem horário previsto. Antes de ir para o Brasil, já estava acompanhando as notícias sobre as chuvas de São Paulo durante o mês de Janeiro, mas não gostaria de fazer parte das estatísticas mais uma vez.
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Por mais de uma hora esperei sentada, na esperança de saber pelo menos que horas o vôo poderia sair. Já não me sentia bem. Um mal estar terrível começou. Já não me sentia confortável na cadeira, minha garganta doía, muita vontade de deitar, uma fraqueza em geralm exatamente igual da que vem no começo de uma gripe. Tudo que eu mais queri era estar na minha casa e ter uma cama para deitar. O celular da menina ao lado soava como uma bomba para minha cabeça, cada vez que ela tentava sintonizar a novela Viver a Vida, com aquela antena enorme para lá e para cá. Tem horas que a tecnologia só atrapalha, principlamente quando as pessoas não usam algo relativamente velho para a tecnologia: o fone de ouvido.
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Sobrevivi 3 horas ali...sem sair do lugar, com medo de levantar, e alguém super bornzeado, que estava voltando da praia, sentasse no meu lugar. Contava minuto por minuto, até que avisaram sobre o meu vôo, deveríamos ir para outro portão, no andar de cima. Juro que quase me arrastei até lá, mas feliz o suficiente de saber que a chuva tinha diminuído.
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Toda hora que lembrava da minha mãe meu olho enchia de lágrimas e acho que aquilo acentuava mais o meus rosto cansado. Depois do embarque, ja agradecendo mais uma vez a Deus, por finalmente estar ali dentro, um senhor me perguntou se eu estava cansada, "Pior do que cansada eu diria, só quero chegar logo em Londrina". Não tive ânimo nem voz para explicar para ele toda a história.
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Dormi durante quase todo o vôo. Não acreditei quando vi Londrina pela janela. Muito menos quando vi o aeroporto...só tentando enxergar minha mãe e meu irmão. Saí do avião o mais rápido possível, não olhei p cima, não tentei ver mais ninguém, eu só queria pegar minha bagagem, abraçar todo mundo e ir embora. Assim que entrei no saguão para retirar as malas, já consegui ver minha mãe e meu irmão, ambos me dando tchauzinhos. Abaixei a cabeça e senti vontade de chorar.
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Peguei minha mala e fui...Depois de 3 anos, eu não tinha voz para dar o mais caloroso dos "ois" e tudo que consegui falar depois de abraçar minha mãe e meu irmão foi, "Eu nunca mais volto para o Brasil". Expliquei tudo para ela com a voz bem fraca e rouca, falou que me levaria para o hospital, mas naquela situação, eu não tinha mais ânimo para enfrentar mais uma fila, muito menos a de hospital. Fomos para uma farmácia ver se conseguiríamos comprar algo para minha garganta, enquanto eu tentava convencê-los de que não queria dormir em Londrina aquela noite, queria ir para minha casa!
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Na farmácia, foi indicado um antialérgico. Segundo o farmacêutico, poderia ser alguma alergia causada pelo clima ou algo relacionado ao estresse. Primeiro diagnóstico errado. Medicada, fomos para casa.