segunda-feira, 8 de novembro de 2010

4. Praia

Esperei tanto tempo para ver uma praia de verdade, praia do Brasil, com biquinis pequenos, sorvete da Kibon, churros, milho verde...Tanta coisa boba que faz falta quando pensamos nas férias.
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Depois de medicada e certa que minha suposta gripe seria curada, fomos para Balneário Camboriú. Sem minhas roupas ainda, pois a mala ainda não tinha chegado, emprestei roupas da minha mãe e fomos viajar na madrugada seguinte. Sem voz e um pouco fraca fui com meu irmão no banco de trás do carro. Durante a viagem não me senti mal, lembro que dormi quase todo o trajeto e acordei já dentro da cidade. Foi bom olhar pela janela e ver aquele mar denovo, sentir o cheiro específico que sinto toda vez que viajo para a praia, mas que não sei explicar. Sentir que realmente as férias chegaram e que era tempo de aproveitar o sol, calor e comer todas as comidas com frutos do mar que queria comer denovo.
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Assim que paramos o carro para meus pais procurarem um apartamento, tentei esticar as pernas e movimentar um pouco para ver se a dormência melhorava. Já não sentia mais só nos pés, mas nas pernas inteiras. Dava tapinhas para ativar a circulação, mas ainda assim nada.
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Depois de instalados e com toda a bagagem no apartamento, preparei minhas máquinas fotográficas para tirar todas as fotos que estava planejando, mas o sono bateu mais forte e dormi a tarde inteira. Ao acordar, quase de noite, estava só meu irmão no apartamento, meus pais estavam em um bar com um casal de amigos, hoje nossos amigos, pois depois de tudo fiquei próxima deles também, tomando uma cerveja claro, depois de se encontrarem pela primeira vez na praia. Era meu aniversário e eu não tinha voz e nem forças para comemorar.
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Me troquei e fui com meu irmão encontrá-los. Foi significante de um dia para o outro como a fraqueza nas minhas pernas tinham aumentado. Coloquei uma sapatilha que costumava usar em Dublin, mas sentia o meu pé desconfortável usando ela naquela noite. Mas não era desconforto, eu não sentia meus pés. Ainda conseguia andar porque minhas pernas estavam fortes o suficiente para aguentar meu corpo e meu pé obedecia os comandos do meu cérebro, acho que foi por isso que era estranho caminhar, sentia as pernas, mesmo formigando, mas já não sentia meus pés totalmente.
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Fui caminhando com meu irmão, mas pedia para ele ficar sempre do meu lado, tinha a impressão que minhas pernas falhariam a qualquer momento. Algumas vezes até segurei nos braços dele, caso encontrasse uma rampa ou um degrau para subir.
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No bar foi bom, mas não como esperava. Por meses, desde a compra da minha passagem, estava esperando um aniversário diferente, animado, do lado da minha família, mas não aconteceu. Foi bom conhecer os amigos dos meus pais, mas a frustração de não poder conversar e contar todas as histórias que tinha para contar foi revoltante. Também estava louca para tomar uma cerveja bem gelada, mas isso não aconteceu por conta dos remédios que estava tomando. No fim da noite saí de lá calada e frustrada, mas mesmo assim ainda estava sentindo uma euforia por dentro, por estar naquela cidade, por estar no verão...
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O caminho de volta foi um pouco mais difícil. Também precisei da ajuda da minha mãe para descer ou subir qualquer degrau e mesmo nas partes planas. É inexplicável a sensação, não é uma fraqueza normal de uma gripe ou anemia, é como se seu corpo estivesse morrendo em partes, e sentir suas pernas morrerem aos poucos enquanto anda não é algo fácil, mas mesmo assim não tinha idéia da proporção do problema que estava acontecendo comigo. Quando chegamos no apartamento, foi a parte crítica, não consegui subir as escadas na entrada do prédio e pela rampa de acesso para deficientes, meu irmão me empurrava por trás enquanto só fazia os movimentos de andar para a frente, mas sem forças suficiente para fazer isso sozinha. Assim foi meu primeiro dia na praia e meu aniversário.
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Dormir começou a ser algo difícil também. Com um mal estar geral, sentia dores no corpo e um tipo de insônia apareceu. Não conseguia dormir um sono pesado e acordei várias vezes durante aquela noite me sentindo muito mal. Não me lembro direito que tipo de dor eu sentia, mas lembro que rezei muito durante a noite, pedindo para que tudo aquilo passasse e que pudesse aproveitar de maneira digna minhas férias. Na manhã seguinte foi o dia de entrar no mar pela primeira vez.
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Assim que acordei, coloquei o biquini da minha mãe, ainda me sentindo gorda por conta dos 18 quilos que ganhei na Irlanda, mas fui, depois da minha mãe falar que estava magrinha, trabalho de mãe...
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Com todo o barulho do mar, músicas, trânsito, era mais difícil ainda alguém escutar minha voz, então ficava com meus pensamentos...Para animar um pouco meus pais, o casal da noite passada foi nos encontrar. Conheci a Mariana, filha deles, que animou um pouquinho minha manhã. Brincamos na areia, tiramos foto, entramos no mar...e foi lá que ela me viu andar pela última vez. O mais engraçado de tudo foi ela me perguntar por que eu falava tão baixinho, não entendendo a minha falta de voz.
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Naquele dia ainda consegui entrar no mar e aproveitar um pouco. Quando sentei na areia para brincar com a Mariana e minha mãe, não tinha muita força para segurar minhas pernas cada vez que uma onda vinha, e levantar sozinha do chão, já não era algo muito fácil.
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Mais uma noite veio e não consegui dormir mais uma vez, mas desta vez foi pior. Deitei no sofá da sala para assistir televisão, mas mesmo assim não conseguia esquecer minhas pernas. Eu meio que sentia elas e ao mesmo tempo um pouco de dor se ficasse muito tempo na mesma posição. Fiquei tão irritada com aquilo naquela noite, que entrei no chuveiro e dava tapas fortes nas minhas pernas. Queria sentir dor ou fazer a circulação voltar, queria que o que seja lá que tinha ido embora, voltasse, queria me sentir forte denovo.
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Quando saí do banho vi a cara do meu irmão me olhando assustado e já tinha entendido que ele tinha escutado o barulho dos tapas e logo expliquei o que estava fazendo. "Ah, percebi mesmo", ele comentou depois da explicação. Mas mesmo com todo meu esforço, tudo continuava igual. Tomava a medicação corretamente, mas a voz também não voltava, apesar de não sentir mais nada na garganta. Foi mais uma noite difícil, ainda sinto o cheiro daquele apartamento toda vez que lembro daqueles dias. Me lembro de cada detalhe do lugar onde meu corpo falhou.
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Na manhã seguinte era o dia que minha tia Sílvia, de São Paulo ia chegar para ficar com a gente alguns dias na praia e depois de 3 anos conheceria minha prima que nasceu meses antes da minha viagem para a Irlanda. Mais um dia normal de praia, mas a fraqueza foi aumentando. Naquele estágio eu já não conseguia levantar sozinha da cadeira, precisava usar toda a força do meu braço, segurando em algum lugar, normalmente no guarda-sol, para eu poder me levantar. Entrar no mar também foi um pouco mais difícil, pois não conseguia ficar em um ponto fixo, pois a correnteza me levava.
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Foi um dia difícil, pois a piora foi bem significativa desde então. Foi aí que minha mãe decidiu me levar ao médico. Fui para uma clínica da Unimed e esperei até ser atendida. Contando toda minha história e meus sintomas, o diagnóstico foi o mesmo, estresse e um pouco de gripe. Continuei com a mesma medicação, tomei um calmante ainda na clínica (não entendo até agora porque me deram tanto calmante) e fui embora.
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Mais um dia de sol veio e mais uma vez tentei aproveitar a praia. E foi na beira do mar que recebi uma das melhores notícias até então. Minha mãe recebeu uma ligação de Congonhinhas, avisando que minha mala tinha chegado e que já estava em casa. "Agora a Cíntia volta a andar!", minha mãe falou toda empolgada. Foi bom saber que minhas coisas tinham chegado. Só foi triste perder os queijos que estavam na mala e que deram um novo perfume para todas as minhas roupas...Afinal, ninguem espera receber a bagagem uma semana depois da sua viagem, o queijo não estragaria se tivesse chegado junto comigo...
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Fiquei bem feliz e realmente acreditei que minha saúde poderia melhorar. Vai que era realmente estresse por causa de toda a preocupação que tinha passado até chegar no Brasil, e com a chegada da mala tudo acabaria, mas era só um sonho meu. Foi ficando cada vez mais difícil andar e falar. A dormência nas mãos era mais forte e a fraqueza nas pernas também. Quando cheguei no apartamento, precisei pela primeira vez de ajuda da minha mãe para tomar banho e trocar de roupa, já não conseguia fazer coisas simples como estas. Foi o começo de tudo, de perder todo o pudor e vergonha de mostrar o corpo nu para outras pessoas, quando você precisa de ajuda, algumas coisas deixam de ser tão importante.
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Como não melhorava e ainda tinha o retorno ao médico, fomos para a clínica denovo, conversar com mais um médico. Tudo parecia bem para ele, mas ninguém sabia explicar minha falta de força no corpo. Confesso que não me lembro que remédio me receitaram desta vez, mas também não funcionou. Meu quinto diagnóstico errado em pouco mais de uma semana. O que mais me frustrava também naquela altura da situação, era não conseguir conversar com o Pankaj, meu namorado, que estava na Irlanda. Eu não tinha voz, então como falaria ao telefone? Poucas vezes me esforcei ao máximo e só para ele desabafei todas minhas preocupações. Tentando ajudar, ligou para a Índia algumas vezes, conversando com uma tia que é médica psicanalista, me deu o nome da doença que poderia ser, falava que tinha cura, que era só ter paciência, fez de tudo para me tranquilizar, mas estava ficando com medo. Não era mais algo simples, dava para ver.
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O tempo todo, quando você tem sintomas como esses, tem consciência de que algo sério está acontecendo, mas nunca consciência suficiente para entender que algo gravíssimo está acontecendo, até acordar com um lado do rosto paralisado.
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Naquele dia, acordei, escovei os dentes, me olhei no espelho duas vezes, uma no banheiro e outra no espelho do corredor, mas não sorri em nenhum momento. Não era uma das manhãs mais felizes para eu poder sorrir para mim no espelho. Fui para a mesa tomar café da manhã e meus pais já estavam lá. Até hoje não sei o que eles conversavam sobre o meu caso naquela altura dos problemas. Acho que estavam tão preocupados quanto eu estava, mas sempre mais seguros do que eu estava.
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Não quis comer nada e resolvi beber suco e foi aí que percebi tudo. Assim que tomei o primeiro gole, ou pelo menos tentei, vazou tudo, minha boca não segurou o líquido até eu engolir. Na mesma hora fui me olhar no espelho denovo, tentei sorrir, voltei e falei para eles que achava que um lado do meu rosto estava paralisado. Definitivamente o lado direito do meu rosto estava paralisado. No mesmo momento achei que era derrame e acho que eles também pensaram.
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Fomos direto para a clínica denovo, e aquela foi a vez mais difícil. Durante todo o trajeto, sentada no banco de trás de carro e com a cabeça encostada no vidro, chorava toda vez que via alguma menina que parecia ser da minha idade caminhando na praia, ou olhando vitrines na rua. Tudo que eu queria naquele momento era estar no lugar daquelas pessoas. Sem preocupação e dor, estar lá, aproveitando a cidade e as férias. Eu não pensava no que eu poderia ser, mas no que eu não queria mais sentir. Já era o suficiente, queria que a "brincadeira" parasse ali mesmo, pois já estava ficando muito sério para mim.
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Quando chegamos na clínica, precisei de ajuda para sair do carro e andar. Quando entramos, sentei logo na primeira cadeira, perto da porta, porque não conseguia mais andar direito. Minha mãe queria pedir cadeira de rodas para mim, mas não queria aceitar naquele momento, ainda conseguiria entrar no consultório andando.
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Antes de todas as consultas, eu tinha que passar por um residente ou estagiário e descrever o que estava sentindo. Foi assim todas as vezes, mas desta foi mais difícil. Expliquei sobre a fraqueza que vinha sentindo nas pernas e a dormência nas mãos, que isso durava alguns dias, mas que hoje tinha acordado com um lado do rosto paralisado, e foi aí que meus olhos encheram de lágrimas e o menino que me atendia me olhou com dó.
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Acho que este foi um dos melhores médicos com quem me consultei na cidade. Quando entramos no consultório, ele perguntou o que acontecia comigo e logo olhei para minha mãe. Aquele era um olhar que significava: explica para mim, pois quase não tenho voz e não aguento mais falar a mesma coisa." Depois de toda a história, ele pediu para eu subir na maca para ser examinada. Na mesma hora minha mãe se levantou para me ajudar e ele a fez parar na mesma hora "Deixa mãe, deixa ela fazer sozinha, eu quero ver." Com dificuldades eu me levantei, dei alguns passos, tentei subir a escadinha da maca, mas o médico me ajudou e finalmente sentei. Ele viu o que queria, que não tinha mais força nenhuma.
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Depois de examinar minhas pupilas ele foi bem claro. Não havia a possibilidade de ser derrame, pois elas estavam reagindo à luz, ao mesmo tempo que foi um alívio, a dúvida ainda continuava. Não deu nenhuma opinião do que poderia ser, e me encaminhou para um neurologista. Na verdade nos deu uma lista de neurologistas da cidade e pediu para marcarmos uma consulta o mais rápido possível, e foi aí que começou a corrida.
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Quando chegamos no apartamento, eu fui logo deitar, pois a doença estava evoluindo rápido e estava fraca. Minha prima estava hospedada com a gente e mesmo assim não tive a oportunidade de conviver melhor com ela, pois já não conseguia ir para a praia, e como toda criança, ela ía todas as manhãs com minha tia, enquanto eu ficava deitada. Naquela manhã não foi diferente.
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Depois de várias ligações, meus pais conseguiram duas consultas para mim no dia seguinte, uma em outra cidade e uma em Balneário Camboriú, e acho que foi aí que hoje consigo ver as ações de Deus durante todo esse processo. Foi a escolha que meus pais fizeram que fez toda a diferença, pelo menos penso eu. Era uma corrida contra o tempo, mas não tínhamos conhecimento disto.
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Ficou decidido durante o dia que seria melhor para todos eu me consultar com o neurologista de Balneário Camboriú. Mais uma vez com a ajuda da minha mãe tomei meu banho. É impressionante as lembranças que tenho, e muito mais do que isso, não dá para acreditar como tudo foi se desenvolvendo e a dor que sentia pelo fato de não ter a mínima idéia do que estava acontecendo comigo. É uma agonia sem fim.
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No banho não conseguia mais me curvar para lavar as pernas, me apoiava o tempo todo na parede com uma das mãos e tentava me lavar com a outra. Para me secar pior ainda, precisava segurar o peso da toalha, mas não era fácil. Na hora de me vestir era essencial a presença da minha mãe, pois como não conseguia levantar uma das pernas enquanto estava em pé para vestir a calcinha ou shorts, ou até mesmo abotoar o sutiã, ficava sentada na cama e minha mãe fazia tudo por mim.
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Como Santa Catarina é um dos destinos mais procurados nas férias pelas pessoas da minha cidade, não foi coincidência ter um dos médicos de Congonhinhas por lá. O Dr. Arildo, conhecido dos meus pais e sua família, estavam em Bombinhas passando a temporada. Como é um lugar próximo de onde estávamos, meu pai decidiu me levar até lá para o Dr. dar uma olhada no meu caso. Foi outra viagem muito difícil para mim, porque mais uma vez sentia inveja ao ver as pessoas se divertindo e curtindo o verão, e seria a primeira vez que entraria em contato com pessoas que me conheciam anteriormente, e neste caso, reencontraria pessoas no pior estado que eu poderia me encontrar até então, pois não os tinha visto desde o ano que fui para a Irlanda, em 2007, e ninguém quer rever pessoas com problemas nas pernas e com o rosto paralisado. Besteira, claro, mas sou humana e era assim que me sentia.
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Assim que chegamos em frente da casa que estavam, a mulher dele, Cecília, veio nos receber. Foi incontrolável minha reação e foi a primeira vez que meus pais me viram chorar muito. Quando eu a vi e abriram a porta do carro para me ajudarem a sair, chorava muito, mas o desespero dentro de mim era maior ainda. Quando fomos entrando pelo quintal da casa e vi que tinham mais pessoas lá, não consegui olhar para ninguém, abaixei minha cabeça, continuava chorando e finalmente entrei na sala. Me acomodei no sofá, minha mãe conversava com a Cecília e esperávamos para conversar com o Dr. Arildo. Filha e sobrinha deles estavam na sala também, mas para eu me sentir mais a vontade, ele pediu para todos se retirarem e começamos a "consulta". Não tinha muito o que fazer, mas as palavras dele me acalmaram muito. Me explicou sobre as possibilidades, também sobre o estresse que tinha passado e me deu um pouco de paz e esperança. Também aplicou uma injeção que faria meus músculos reagirem e falou que acordaria bem no dia seguinte. Saí de lá muito melhor do que quando cheguei e fui para casa dormir e esperar para acordar bem.
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Enquanto estava no meu quarto, já no apartamento, meus pais conversavam com minha tia, que é veterinária, na sala e escutei ela comentar que quando os cachorros não conseguem andar ela aplica a mesma injeção que tinha acabado de tomar e os cachorros ficavam bem. É estranho escutar isso, e engraçado, mas também era uma notícia boa, querendo ou não.
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Mais uma manhã chegou e não acordei nada bem. Enquanto esperava meu pai trazer nosso almoço, falava das minhas preocupações e ela falava das que ela sentia. Não tínhamos idéia do que o neurologista iria nos falar mais tarde. Assim que meu pai chegou tentei almoçar, mas também era difícil mastigar com o rosto daquele jeito. O Dr. Arildo também tinha receitado muito líquido, mas foi preciso improvisar um canudo para eu conseguir beber, pois nada parava na minha boca.
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Finalmente chegou a hora de ir para a consulta. Minha mãe me ajudou a vestir mais uma roupa que tinha me emprestado e arrisquei até a passar um corretivo no meu rosto para parecer um pouco melhor. Quando chegamos subi com muito esforço a rampa em frente do consultório e fomos nos informar em que andar do prédio estaria o médico. Pegamos o elevador e fomos para o andar da neurologia. Já no elevador sentia minhas pernas cada vez mais fracas, era a primeira vez que ficava em pé mais de 3 minutos  e já sentia muita dificuldade em ficar naquela posição. Toda a minha concentração estava nos pés, como se não fosse mais natural andar, fazia uma força a mais para enviar os estímulos para meus membros inferiores e rezava para não cair.
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Quando chegamos na sala de espera, é inevitável não olhar para todas aquelas pessoas e imaginar o que estão fazendo em um neuro. Eu não consegui me ver ali. Enquanto meus pais conversavam entre eles, e em questão de segundos a atenção foi desviada de mim, minhas pernas falharam pela primeira vez. Senti que ia cair, o máximo que consegui foi dar um passo e cair em uma cadeira. Se aquela cadeira não estivesse ali, cairía no chão, pois voz não saiu para pedir ajuda.
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Entramos meu pai, minha mãe e eu no consultório. Todos muito assustados mas também com esperança. O médico prestou atenção na forma como entrei no consultório, minha dificuldade de andar e sentar. Contamos toda a história mais uma vez e já não conseguia segurar minhas lágrimas. Chegou a hora de me examinar e denovo ele pediu para eu ir sozinha até a maca. Meus pais não tinham uma visão clara do que o médico estava fazendo, pois um biombo separava a sala em duas partes, mas foi algo bem simples. Com o famoso martelinho que vemos em desenhos animados e filmes, ele bateu nos meus joelhos e nem o esquerdo ou direito reagiram. Fique assustada quando vi aquilo, ele batia e a perna não subia.
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Me deixou sentada na maca e foi falar com meus pais. Esta cena é algo que nunca mais vou esquecer na minha vida. O consultório todo branco, eu só conseguia ver as costas dos meus pais e escutar a voz do médico. "Olha, o que ela tem é grave, suspeito de uma doença chamada Síndrome de Guillain-Barré, mas pode ser outras coisas também. Quero que ela seja encaminhada agora para o Hospital do Coração, pois possui UTI onde ela ficará internada. Nós vamos fazer de tudo para salvar a vida dela."
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Eu chorei, chorei muito. A única vez que tinha ficado internada na vida foi por uma falsa infecção no rim e no máximo tomei soro na veia. De repente estava indo para uma UTI, com risco de parada respiratória. Não sei como saímos daquele lugar, eu ainda não sei como consegui dar meus últimos passos. O médico ficou de me encontrar no hospital às 6 da tarde para fazer uma punção lombar (A punção lombar é um procedimento através do qual se colhe líquido encefalorraquidiano, contido na medula espinhal (dentro da coluna) e cérebro, para diagnóstico de alterações ou infecções neurológicas).
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Agora toda minha procupação tinha se voltado a este exame, senti medo, muito medo...Antes de enfrentar uma UTI, teria que enfrentar uma injeção na coluna, e me dói hoje só de lembrar...